A inteligência artificial deixou de ser prova de
conceito para se tornar infraestrutura estratégica da moda. Em poucos anos, a
tecnologia passou de testes isolados em recommendation engines para ocupar
tarefas críticas em toda a cadeia de valor. Hoje, a IA ajuda a decidir o que
produzir, em que quantidade, para quais praças e por qual canal. A
digitalização acelerada no pós-pandemia e a consolidação do e-commerce criaram
dados suficientes para que algoritmos aprendessem padrões de consumo, variações
regionais e ciclos de tendência, encurtando o caminho entre desejo e entrega.
Nos bastidores, modelos de previsão cruzam histórico de
vendas, clima, eventos locais e tráfego por canal para projetar volumes com
semanas de antecedência. O planejamento gera ordens de produção dinâmicas, que
alimentam fornecedores e centros de distribuição com maior precisão. No varejo,
sistemas de gestão ajustam automaticamente preços e reposições por loja e por
SKU, evitando tanto ruptura quanto excesso.
Na ponta, plataformas de personalização consideram gosto, medidas aproximadas, clima e contexto para exibir vitrines diferentes a cada usuário. Essa camada já recomenda itens específicos conforme preferências e estação. É o caso de algoritmos que priorizam uma calça pantalona em regiões onde a tendência de modelagens amplas coincide com temperaturas amenas, aumentando conversão e reduzindo devoluções por inadequação de uso.
Casos reais, quem já está fazendo
Grandes varejistas adotam IA para prever demanda por
cor, tamanho e caimento, além de planejar sortimento por praça. Marketplaces
aplicam visão computacional para classificar imagens, detectar incoerências de
cadastro e acelerar moderação de catálogo. Plataformas de live commerce
capturam sinais de engajamento em tempo real para ajustar o “carrossel” de
produtos durante a transmissão. Marcas independentes usam ferramentas
acessíveis para gerar variações de estampa, testar paletas, simular caimento em
avatares e automatizar o tráfego de anúncios com orçamentos pequenos.
No backoffice, a IA acelera a criação técnica: extração de fichas, sugestão de grade, cálculo de consumo de tecido e simulação de encaixe. Na logística, roteirização inteligente e previsão de capacidade de last-mile reduzem atrasos e custos. No atendimento, chatbots evoluíram para copilotar o pós-venda, resolvendo trocas com base no histórico do cliente e na política da empresa.
IA, criatividade e ética
A discussão deixou de ser se a IA cria ou não moda e
passou a ser como ela participa do processo. Ferramentas generativas auxiliam
pesquisa de referências, combinação de silhuetas e prototipagem visual. O papel
humano migra para curadoria, direção criativa e construção de significado. Há,
porém, alertas importantes. O uso de dados exige consentimento claro,
governança e propósito legítimo. Viés algorítmico pode invisibilizar corpos,
estilos e regiões, reproduzindo desigualdades. Direitos autorais pedem regras
para treinamento de modelos e uso de obras de terceiros. No trabalho, a
automação deve vir com requalificação e desenho de novas funções, preservando
ofícios e ampliando produtividade de forma justa.
Regulamentações emergem com padrões de transparência,
auditoria de modelos e proteção de dados. Para marcas, a vantagem competitiva
será combinar eficiência algorítmica com ética aplicada: explicabilidade mínima
nas decisões que afetam pessoas, diversidade nos dados e métricas que
considerem impacto além do clique.
A IA não é mais promessa. É presente contínuo que
reorganiza a moda do planejamento ao pós-venda. Quem combinar dados de
qualidade, processos bem desenhados e cuidado ético terá ganhos duradouros em
margem, relevância e reputação. A próxima fronteira está na integração total do
ciclo: criar, prever, produzir, distribuir e aprender a cada giro, com o humano
no comando da visão e a máquina no suporte da execução.





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